No dia 10 de dezembro, comemoramos os 65 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Ninguém deseja negar que se trata de um passo qualitativo na história turbulenta da humanidade. O reconhecimento universal dos direitos da pessoa humana é, sem dúvida, motivo de esperança para o ordenamento das condições de convivência humana e sobrevivência de tantos. Se olharmos, não muito longe, para traz, veremos escravos usados como coisas; as crianças e mulheres também, mais remotamente. Os prisioneiros de guerra, os doentes e velhos. Todos sacrificados de forma inaceitável.
Claro que a lembrança histórica não é uma afirmação de que já superamos todas as formas de escravidão e prepotência. Há formas sutis de escravidão que estão disseminadas em nossa convivência atual. Escravidão é o uso e abuso de adolescentes e a venda dos seus corpos para o mercado nacional ou estrangeiro. Escravidão é “coisificar” crianças que são “matadas” no útero materno, ou fora dele, para usos quaisquer, até para o comércio de órgãos a serem transplantados.
Quando na época nosso saudoso Papa João Paulo II, em entrevista que deu origem ao já conhecido livro “Cruzando o limiar da Esperança”, foi inquerido sobre o assunto dos Direitos Humanos, ele retomou, com clareza, a doutrina permanente da Igreja que coloca a dignidade humana na origem e na criação. “É evidente, diz o Papa, que estes direitos foram inscritos pelo Criador na ordem da criação; por isso, aqui não se pode falar de concessões por parte de instituições humanas, por parte dos Estados e das organizações internacionais”. E o Papa continua apelando para a Fé a fim de justificar a grandeza do homem e seus direitos inalienáveis. “O Evangelho é a confirmação mais plena de todos os direitos do homem”. Será por isso, talvez, que ele confessa: "o interesse pelo ser humano, como pessoa, estava presente em mim há muito tempo". E fala do assunto como tema central da atividade pastoral.
A lembrança do evento dos 65 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos quer ser oportunidade para retomar, relembrando, algumas afirmações substantivas.
1. A Igreja sempre esteve ligada, por sua compreensão de Fé, à defesa dos Direitos Humanos. Sem esquecer duas coisas importantes. Falar de direitos não esconde deveres. Direitos e deveres têm estrutural reciprocidade. Depois, falar de direitos não significa, infelizmente, que todos os que neles falamos praticamos plenamente o que pensamos.
2. Trata-se de congratular-me com o Centro de Defesa dos Direitos Humanos, que não é organismo da Igreja Católica, pela iniciativa de um Seminário, no Centro de Pastoral Pio XII. Ali foram examinados, como temas fundamentais, a constatação do estado atual de desrespeito aos direitos fundamentais das pessoas e o contributo que os cristãos, de modo especial, podem dar para reverter o quadro multiforme de violência que se verifica em tantas partes.
3. Além do direito à vida, a que aludimos inicialmente, o direito a uma vida digna faz parte da condição humana. O direito à saúde, à moradia, à escola, à privacidade e todos os que se relacionam com a cidadania devem ser promovidos por nós, cristãos, como exigência da nossa Fé!
Dom Gilberto Pereira Lopes Bispo Emérito de Campinas
Diretor Espiritual da Comunidade Católica Sal e Luz